do primeiro plano
e ao fundo na pintura
a mulher nua se mira
em terceiro plano
e de lá nos observa
do espelho-tela
me captura
seu corpo escancara
seu olhar devora
sou eu o voyeur
do lado de fora
ou seu perplexo objeto
de investigação?
lançado pra dentro
no vácuo abissal
das frestas da imagem
no vértice das pernas
fendas expostas
no corpo da esfinge
seus olhos me sugam
seu sexo me encara
à margem das cenas
em discreto plano secundário
o pintor Lucien Freud
projeta o olhar sobre tudo
no interplay visual dos dois planos
duas fronteiras tênues
dois espelhos d'água
na tela do monitor
e na janela desse álbum de fotos
transita o olhar do artista
que a tudo rastreia e a tudo desvenda
impõe seu fálico mirar oceânico
no perene recobrir de pele, carne e ossos
sedimenta sob camadas de cor
sobre o leito da tela
o corpo da mulher
que antes era pura nudez explícita
agora fala de pintura
artista-analisando e analista
imagem, análise e poema
chegam a seu termo
exauridos pelo mesmo
corpo a corpo com o inesgotável tema
não têm mais nada a dizer
além das duas ou tres coisas
que sei dela
igor k marques
jun.ago/2011
“duas ou tres coisas que sei dela”
[a partir de “Deux ou Trois Choses Que Je Sais D’Elle” de Jean-Luc Godard]